Parentalidade e Contemporaneidade: os desafios para a Psicologia
Sinopse
Há mais de meio século, a Psicologia se dedica a estudos que envolvem a maternidade e suas implicações para o desenvolvimento emocional do filho, para a conjugalidade e para a própria mulher, tanto para aquelas que vivenciam a maternidade quanto para as que não optam por ela. Nas últimas décadas, a paternidade também se tornou foco recorrente de estudos antropológicos, filosóficos e psicológicos. O aumento do interesse pelo papel do pai na família e na sociedade se intensificou a partir da inserção da mulher no mercado de trabalho, ocorrida no Brasil em meados da década de 70. Atualmente, é possível perceber uma equivalência entre pesquisas envolvendo homens e mulheres que escolhem experenciar a parentalidade e esse conceito dinâmico tem tido maior destaque na realidade brasileira.
Considerando a importância da produção de conhecimento na área da parentalidade e Psicologia, neste livro, busca-se discutir os desafios da família, do ser pai e mãe hoje. Assim, esta obra é composta por oito capítulos e congrega estudos teóricos e de pesquisa de pesquisadores do Centro Universitário Franciscano, Universidade Federal de Santa Maria, Universidade do Vale do Rio dos Sinos, Fundação Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e Universidade Federal do Rio Grande do Sul, além de profissionais colaboradores.
No primeiro capítulo, Fernanda e Marlene abordam o papel de mãe na sociedade contemporânea no contexto de famílias oprimidas, especialmente no que diz respeito às situações que envolvem a violência. As autoras discutem como se constituiu historicamente a noção de maternidade, abordam as dificuldades das mães que vivem em situação de opressão social no exercício da maternidade e discutem como a violência estrutural se impõe como mais um fator de risco para a violência contra a criança e adolescente praticada pelas mulheres no exercício da função parental.
No segundo capítulo, Juliana e Aline discutem, teoricamente, as dificuldades no exercício da parentalidade após separação conjugal impostas pela Síndrome da Alienação Parental. As autoras demonstraram que a alienação parental é uma forma de abuso que coloca em risco a saúde emocional da criança, repercutindo na vida adulta. Assim, é importante a identificação desse fenômeno para que o alienador seja encaminhado a um processo terapêutico e elabore a separação, salvaguardando os filhos das terríveis repercussões da alienação para o desenvolvimento.
“Tornar-se pai, tornar-se mãe de um bebê com malformação cardíaca congênita: as repercussões do diagnóstico na parentalidade” é título do terceiro capítulo, que tem como autoras Cristina e Rita de Cássia. Nesse texto, as autoras apresentam uma revisão teórica sobre a parentalidade em relação ao diagnóstico de malformação cardíaca do filho. A leitura do texto indica que o diagnóstico de cardiopatia congênita do bebê interfere de maneira significativa no processo de transição para a parentalidade, bem como na dinâmica familiar. O momento em que ele é descoberto, bem como a forma como o diagnóstico é transmitido à família são elementos capazes de marcar de maneira significativa essa experiência.
No quarto capítulo, as autoras Patrícia e Camila buscam conhecer como os homens compreendem e exercem a paternidade a partir de sua relação com seus filhos, como a qualificam, de que modo acontece a aproximação pai-filho, e descobrir se veem diferenças entre sua forma de ser pai e do seu próprio pai. Para tanto, as autoras entrevistaram sete pais de diferentes níveis de escolaridade e socioeconômicos e foi possível perceber que os participantes se percebem enquanto pais participativos, envolvidos nas atividades de cuidado e proteção aos filhos. Este dado é interessante por demonstrar que os pais entendem sua paternidade como um exercício de participação diária e direta no contexto familiar, no envolvimento em atividades de cuidado e proteção, não apenas em momentos de lazer ou de suporte financeiro.
Graziela, Daniela e Camilla são autoras do quinto capítulo, no qual apresentam um estudo empírico que objetivou identificar, entre mulheres inférteis, o desejo de gravidez e de maternidade, a partir de seus sentimentos, expectativas e medos. As autoras destacam que, diante da infertilidade, algumas mulheres que desejam a maternidade lançam mão de técnicas de reprodução assistida que, quando malsucedidas, podem gerar ansiedade e frustrações. Nesses casos, há o surgimento de intensas expectativas quanto à concretização do seu desejo de gravidez e de maternidade e, em contra partida, as expectativas em relação aos filhos, no que tange aos seus aspectos físicos e psicológicos, tendem a ser menores. No estudo, ainda destaca-se que a Psicologia deve atentar a esse contexto tendo em vista a importância de se estudar a constituição da feminilidade e da maternidade para as mulheres que vivenciam a sua infertilidade.
Refletir, compreender e explorar a realidade do pai des-casado e a forma como ele exercita e reflete sua paternidade, após a separação conjugal, na relação com os filhos, foi o objetivo do estudo apresentado no sexto capítulo. Cristiane e Dorian, a partir de uma pesquisa empírica, enriquecem a discussão acerca do papel do pai na contemporaneidade. Destacam que é um desafio para os pais na atualidade desempenhar seu papel junto aos filhos, sendo necessário que ambos, mãe e pai, diferenciem “conjungalidade” de “parentalidade” e busquem a coparentalidade. A coparentalidade pressupõe um nível de interação entre os ex-cônjuges para decidir questões da vida dos filhos, em um jogo de papéis em função do cuidado global e bem-estar da criança.
No sétimo capítulo, apresenta-se um estudo empírico que objetivou compreender como mães que constituem famílias monoparentais vivenciam a experiência da maternidade considerando as exigências do cuidado de um filho com síndrome de Down. Dentre as principais conclusões do estudo, evidencia-se a sobrecarga física e emocional das mães e as dificuldades em maternar uma criança com síndrome de Down na ausência da figura paterna. As autoras Simone e Luciane destacam a importância da rede de apoio social da qual devem fazer parte todos os profissionais da saúde que auxiliam nos cuidados à criança, inclusive o psicólogo.
Por fim, no oitavo capítulo, Josiane, Débora e Marcli apresentam dados acerca do exercício da parentalidade para educadores, mães e pais sociais, em situação de instituições de acolhimento, além de trazerem à tona as questões e as dúvidas geradas nessa forma diferenciada de cuidado, demonstrando a importância de intervenções junto a esses cuidadores para que possam exercer uma parentalidade positiva, enfrentando e superando as dificuldades impostas pelo contexto institucional.
Estamos certas que essas produções contribuirão para uma reflexão crítica da parentalidade na contemporaneidade e suas repercussões. Trata-se, portanto, de uma obra que convida o leitor a pensar as relações familiares e os desafios que estas trazem à Psicologia.
Fernanda Pires Jaeger, Cristina Saling Kruel e Aline Cardoso Siqueira
As organizadoras